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sábado, 14 de outubro de 2017

IMPULSIVIDADES

Num de seus livros, “Grandes Sertões: Veredas”, o notável Guimarães Rosa, através de um de seus personagens, destaca que “Viver é muito perigoso”.
De fato, a própria natureza, por si mesma, se encarrega de tornar a nossa aventura terrena algo muito radical.
Zunindo por sobre as nossas cabeças, só aqui no Brasil, por ano, são cerca de 100 milhões de raios com carga positiva, a mais letal delas.
Não bastassem as variações climáticas, o próprio ser humano encarrega-se de complicar os atos de viver, sobreviver e conviver: guerras, violência urbana, corrupção, conflitos pessoais de toda ordem, agressões físicas e verbais, autoagressões de todos os níveis e para todos os gostos: alcoolismo, tabagismo, drogadição, raiva e ódio desmedido, a deteriorar a saúde física e mental. Correndo por fora disso tudo, e maltratando ainda mais, o assédio moral e sexual, bullying, pressões exageradas e extremamente desleais… Catastrofismo? Pessimismo? Não: realidade!
O mesmo Guimarães Rosa lembra também que “Aprender a viver é que é o viver mesmo”, e, neste sentido, a expressão VALORIZAÇÃO DA VIDA, carrega em si mesma, algumas espécies simbólicas de escudos, capacetes e coletes de proteção, na medida em que adotem-se cuidados salutares para com a mente, o corpo e o meio ambiente, ante o burburinho diário.
Se tivermos mais zelo no caminhar, transitaremos em meio aos 100 milhões de raios, de balas nem sempre perdidas, e dos desafios sociais, morais e emocionais, com razoável margem de segurança. Contudo, quando as eventuais dificuldades resultam das atitudes deliberadas de DESVALORIZAÇÃO DA VIDA, quando perdem-se o foco das coisas que propiciam um viver saudável, do conviver sem conflitos, e do sobreviver digno, honrado, dentro do que é de direito, e sem avançar na seara alheia, a boa existência fica comprometida e os sofreres podem se suceder em escala ascendente.
Segundo ensina a teoria humanista formulada pelo também notável psicólogo norte-americano Carl Rogers, todo ser humano nasce com potencialidades suficientes para se entender, e encontrar seus próprios rumos na vida emocional e sentimental.
O ferramental do saber ouvir ativa, respeitosa e empaticamente, propicia naturais possibilidades de compreensão das nuances nos relacionamentos humanos, ofertando larga margem de proteção contra verdadeiros vendavais de sentimentos e emoções conflitantes.
Ouvir com atenção, respeito e aceitação o que o outro tem para dizer, oferece boas chances de sobrevida para aqueles que eventualmente estejam sobrecarregados, e sob o impacto de verdadeiras “descargas elétricas” emocionais, fruto das pressões diárias, das exigências a que somos submetidos, do eterno fantasma do fracasso a rondar mentes entulhadas de responsabilidades e culpas (devidas ou indevidas), do “correr atrás do prejuízo”, dos desafios por vezes aparentemente acima de nossas capacidades.
O recente prêmio Nobel de Economia, Richard Thaler, criador da Teoria da Contabilidade Mental, juntando conceitos de finanças à Psicologia, afirma que vivenciamos a dicotomia (ambivalência), de precisarmos racionalizar os gastos, entretanto, algo em nosso íntimo nos leva a ser irracionais na forma de desembolsar recursos.
A impulsividade tem nos escravizado de A a Z, em todos os setores da vida. Muitos arriscam-se a dar o primeiro passo na direção dos vícios de beber, fumar, ou cheirar, na ilusão de aliviarem-se das tensões geradas, quando racionalizam-se mal os custos e os benefícios de iniciativas infelizes, e raros são aqueles que conseguem desatarem-se dessas amarras.
Ainda girando em torno das teorias de Thaler, sem grandes esforços, dá para perceber que o ato de esbanjar recursos financeiros pode ocasionar pressões indutoras da gana de ter, o que, em tese, tenderá a proporcionar intranquilidades, angústias, níveis de estresses exagerados, tornando a luta pela sobrevivência, muitas vezes, um combate desigual, restando uma vida vivida em ritmo de desvalorização.
O cérebro, o coração e o sistema nervoso trabalham a “todo vapor”, e a vida deixa de ser prazerosa, sem espaço que propicie salutar reconforto, sossego, serenidade.

Riobaldo, o protagonista da obra magistral, apontada lá no início deste texto, na condição de velho fazendeiro e ex-jagunço, transitou entre o amor platônico e impossível de Diadorim, o amor carnal da prostituta Nhorinhá, e o amor puro e verdadeiro de Otacília, conhecendo como poucos sobre as entrâncias e reentrâncias do que vem a ser as peripécias do viver, do conviver e do sobreviver, perigosa e impulsivamente.

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